Desde pequeno que a hora mágica me fascina. Aquele momento em que a noite desiste. Prepara-se o dia e a natureza brilha para lá do horizonte, antes da grande estrela espreitar por entre os prédios das cidades por onde passo.
Acordo ao som de leves sons de um telemóvel qualquer, aquele que meto no bolso dos jeans daquele dia.
De mãos nos olhos tento vislumbrar uma face vivida, em espelhos de hotéis ou na casa onde me permitem hábitos de quem ali vive...só eu.
Cabelos grisalhos, despenteados, resistentes ao passar dos ventos. Pele morena pelo sol do hemisfério do calor. Barba dura de 2 dias, ainda que esbranquiçada da experiência.
Aí está um vulto trabalhado. E persegue-me a existência, quando acordo, quando sem consciência me apercebo que é meu grande amigo e companheiro de todas as lutas.
Em pequeno já ali estava, sem perceber que tudo e nada sabia. Foi crescendo ao mesmo tempo que a realidade me assombrava os sonhos. E ali permanece, cada vez que procuro ver-me, seja onde for.
E orgulho-me da sua figura, do que resta daquele miúdo tímido, envergonhado e sorridente. Nos olhos traz memórias sentidas. Sonhos queimados e outros viajados. Projecta filmes de Hollywood do que sabe, do que viu. Orgulho-me das marcas que transporta e das mazelas eternas das quais não se envergonha. É forte como a rocha, simples como um dia de chuva, carinhoso como o algodão doce, mas louco como um dia de verão. Por tudo passou e ainda quer passar.
Apesar das quedas sempre se levantou, aquele vulto do espelho. Foi deixado, torturado, apedrejado pelo bem que fez. Foi censurado, lisonjeado, magoado pelo mal que provocou. Mas ali está. Verdadeiro, Valorizado pelos valores que teima em não perder. É um sortudo...digo eu. Ou azarado...mas com sorte.
Apesar de tudo, ainda hoje conquista sonhos, antigos e novos. E sem saber como, abrem-se-lhe portas. E atinge metas de primeira linha...profissionais, pessoais, sociais e mais umas quantas "ais". Todas! E em tudo se esmera, se aplica, faz o mundo girar!
Mas tem uma lágrima interna, de um sonho perdido. Não domina essa arte, nem quer dominar. Porque o resto dele depende. Mas aquela lágrima não...bendito livre arbítrio. E chora alegremente pelos cantos daquele espelho que o projecta, para si próprio, para mim, para quem o conhece.